A Renascença foi um novo despertar da civilização ocidental,
após o interregno obscurantista medieval fomentado pela Igreja. Foi um período
no qual o mundo viveu alterações profundas e sem precedentes, embora as
grilhetas do medievalismo persistissem, sobretudo em lugares onde a Igreja era
estimada, mas a acção de milhares de indivíduos dinâmicos e entusiastas que
lutaram durante cerca de dois séculos, acabaria por tornar civilizada uma
dinâmica que se revelou imparável, caracterizada por uma impaciente ânsia de
aventura, inovação e novos horizontes.
Nessa época, a vida quotidiana era angustiante e a sociedade
encontrava-se praticamente estagnada. Os médicos sangravam e acalmavam os
doentes com sanguessugas e os alquimistas, nos seus variados sonhos alimentados
pela avareza, tentavam transformar o metal vil em ouro. O mundo dos vivos era
controlado tanto pelas bactérias transportado por ratazanas que repetidamente dizimavam
enormes quantidades da população da Europa, como pelas guerras feitas pelos
homens que matavam grande parte da população campesina. Entretanto o poder da
fantasia e do medo alimentava pesadelos nos quais os demónios de um mundo
subterrâneo perseguiam e matavam os incautos. A média de esperança de vida era
para a mulher de 24 anos e talvez chegasse aos 27 para o homem. A maior parte
das pessoas tinha fome e padecia de doenças e os ricos sofriam da maioria dos
horrores dos pobres; a peste, a guerra e as epidemias eram efectivamente
democráticas. Quase todos eram iletrados e passavam a maior parte do seu tempo
embriagados. Ao longo da vida a maioria não se afastava além de dezasseis
quilómetros de casa, e alimentava suspeitas patológicas em relação aos
estrangeiros; poucos tinham uma ideia vaga do ano em que se encontravam, e não
tinham o mínimo conhecimento do mundo que se estendia para além da sua vila ou
cidade. A sua religião, apesar de na aparência ser católica, era constituída em
noventa por cento de superstição e artes mágicas; a forma de cristianismo a que
estavam ligados era pouco compreensível e imbuída de uma terminologia quase
mítica. A populaça recebia a doutrinação religiosa numa língua antiga e praticamente
incompreensível, o latim; as obras sagradas ortodoxas eram em geral textos sem
sentido. As coisas só se alteraram em definitivo com o advento da Revolução
Industrial, por volta de 1780.
No século XIV, o esforço secular, humanista e intelectual da
Renascença, teve origem num pequeno grupo de europeus que ambicionando o
prestígio e renome social e com sólidos conhecimentos, buscaram a novidade e o
saber e procuraram activamente os tesouros literários e filosóficos dos
antigos, financiados por nobres endinheirados de Florença e conseguindo
angariar, de castelos árabes e turcos, dos seus mosteiros sombrios e de antigas
bibliotecas em decadência manuscritos perdidos e originais escritos pelas figuras
semi-míticas do período clássico, tesouros desenterrados por historiadores e
linguistas pagos a soldo e cuidadosamente seleccionados. Alguns dos textos
latinos clássicos mais antigos foram encontrados por Boccaccio, Salutati e
Conversini, tendo todos eles trazido para Florença, uma enorme quantidade de
importantes obras. Pouco depois, por influência de Petrarca e outros, a procura
estendeu-se aos antigos manuscritos originais gregos que foram sendo
encontrados e trazidos para Itália, em especial Florença. Deste modo, os
ensinamentos de Aristóteles, Platão, Pitágoras, Euclides, Hipócrates e Galeno,
na sua forma original, deram início a uma nova era de humanismo e reforma,
juntamente com o ressurgimento do interesse pela ciência, pela medicina e pela filosofia.
Contudo a Renascença não foi impulsionada apenas pelo
passado mas também e em grande medida pelo facto de na «Alta Renascença» se
passar a viver num mundo repleto na mais fabulosa criação da Humanidade, a
prensa móvel e a impressão, de que Guttenberg foi pioneiro. Em 1455 foi
produzida a famosa Bíblia de Guttenberg; três anos mais tarde, abria uma
tipografia em Estrasburgo e vinte cinco anos depois, em 1480, havia mais de uma
dezena de tipografias a trabalhar em Roma e no final do século XV, estima-se que
cem tipografias estivessem a trabalhar só em Veneza. Por essa altura, cerca de
quarenta mil livros tinham sido impressos. Antes de 1450 existiam menos de
trinta mil livros, todos eles escritos à mão. Nos finais do século XVI, havia
já um inventário de cerca de cinquenta milhões de livros impressos.
Os historiadores têm alguma dificuldade em chegar a um consenso
relativamente às datas que marcaram o início e o fim deste período. Se os
meados do século XVI é frequentemente identificado com o fim da Renascença,
outros situam-no durante os últimos anos do século XVII, menos de um século
antes das primeiras manifestações do Iluminismo, que germinou com as ideias de
Newton, Descartes e Locke.
Os filósofos da Renascença eram quase todos católicos leais,
que na sua maioria conservavam as suas ideias mais radicais para si próprios. A
igreja Romana amordaçava com determinação a expressão pública de ideias
radicais e perseguia energicamente os autores de qualquer filosofia divergente.
Os chefes da igreja eram instintivamente anti-intelectuais e deliberadamente
obscurantistas, para que os cardeais continuassem a preservar acerrimamente os
seus privilégios, quanto menos os leigos soubessem, melhor. No final do
Renascimento os que eram intelectualmente curiosos, acharam difícil reconciliar
o que era claramente observável e quantificável com a teologia antiga apresentada
pela Igreja.
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