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12/09/18

As Religiões no Império Romano


As Religiões no Império Romano

A primeira religião oriental que chegou a Roma foi a do culto da deusa Cibele e do seu amante Átis – um par divino da mesma natureza que os deuses adorados em templos na Grécia minóica. Cibele, chamada a grande mãe, simbolizava a fecundidade e a força da natureza. Quando do pânico criado pela segunda guerra púnica, o Senado decidiu que o velho Panteão romano precisava de reforços. Foram consultados os livros sibilinos e, em seguida, enviou-se uma embaixada ao rei de Pérgamo, na Ásia Menor. O potentado aceitou, como um favor especial feito aos Romanos, enviar a Roma o velho símbolo do culto primitivo de Cíbele, uma pedra meteorítica preta, a qual foi colocada, primeiramente, no templo da Vitória, no monte Palatino, mais tarde, os Romanos construíram um templo em honra desta deusa. A importação de uma nova religião era um sinal dos tempos, os romanos começavam a adquirir um horizonte internacional. Mas o Senado tomou o cuidado de impedir que os cidadãos romanos participassem no verdadeiro exercício deste culto – na realidade, demasiado exótico e que era preferível reservar para sacerdotes vindos da Frígia. Com efeito, os fiéis eram aspergidos com o sangue das vítimas que deviam purificar o homem dos seus pecados e torná-lo imortal.

De uma natureza completamente diferente era o culto de Ísis, «a mais civilizada das religiões bárbaras». Tinha também a sua origem em antiquíssimas crenças religiosas referentes às ceifas e à alternância das estações. Ísis era oriunda do Egipto. Entrou cedo em Roma. O seu grande santuário de Roma foi construído durante o reinado de Calígula. No centro do culto encontrava-se Ísis, a deusa mãe que tinha ao colo o seu filho Osíris. O culto prestado a Ísis tinha grandeza, com os seus sacerdotes barbeados e envergando vestes de imaculada brancura. Pela penitência e pela purificação (de natureza material, é certo), o ritual místico conduzia à comunhão com a divindade e a uma espécie de ressurreição espiritual.

Mais tarde, sobretudo no século III, apareceram por todo o Império Romano algumas divindades masculinas. Estava-se no tempo dos imperadores-soldados, um período de guerras permanentes; a situação prestava-se bastante ao aparecimento duma crença própria para impressionar as legiões. A forma mais simples dessa crença, estabelecida para agradar aos imperadores-soldados, era o culto do Sol Invictus, o Sol invencível. Esta divindade toda poderosa e triunfante, que estendia a sua mão sobre Roma e as suas legiões, estava identificada com o imperador. Não pode chamar-se ao culto do Sol Invictus uma religião no sentido mais elevado do termo (que pressupõe uma relação entre o crente e a divindade), mas antes um compromisso entre a religião de estado e a propaganda imperial. Desde César que os grandes senhores do império eram, após a sua morte, adorados como deuses; no entanto os Romanos resistiram tanto quanto foi possível, à divinização em vida dos imperadores.
No Oriente a situação era diferente. Os Egípcios, por exemplo, não podiam levar a sério um soberano que não fosse, ao mesmo tempo, um deus. Ignorar esta tradição teria sido uma grave falta política. Quanto mais cosmopolita se tornava o Império Romano, mais os Orientais e as ideias orientais penetravam nas províncias ocidentais e até em Roma e mais o culto do imperador ganhava terreno. No século III já ninguém protestava, nenhum velho romano fazia ouvir a sua irritada voz. Nesta época o culto do imperador era muito mais do que uma manifestação de ambição autocrática. O império atravessava uma crise. A adoração votada ao chefe do estado como se fosse uma divindade exprimia a submissão. Décio e Diocleciano não podiam permitir-se a mínima tolerância para com esses sectários chamados cristãos e que se recusavam a adorar a imagem do imperador. Por isso o i9mperador divinizado veio a acrescentar-se às divindades que o cristianismo tinha de combater.

Um outro deus-soldado, Mitra, impôs-se igualmente aos homens desse tempo, e de uma maneira também diferente. Mitra estava muito próximo do Sol Invencível e o seu culto foi favorecido pelos imperadores, a partir de Cómodo. Quis a sorte, ironicamente, que fosse um imperador perverso e sádico a dar à religião de Mitra a sua posição predominante em Roma.
Mitra chegou, sem dúvida, ao mundo romano através da Pérsia, o país de Zaratrusta. Os persas viram nele o intermediário entre as potencias celestes de Ormuzd e as potencias maléficas de Arimânio. É por isso que Mitra está próximo do homem no combate entre o bem e o mal. O mito conta que Mitra foi um poderoso guerreiro e caçador que combateu o deus-sol e, em seguida, se tornou seu amigo. Na aurora do mundo capturou o grande touro que simboliza aquele. Sacrificou o touro por ordem do deus-sol; desta oferenda saíram o novo mundo e todos os seres vivos.
Os adeptos de Mitra eram obrigados a lutar do lado do bem contra o mal; a sua doutrina ensinava as boas obras e o perdão. A iniciação na comunidade Mitra comportava sete graus e cada um deles possuía o seu cerimonial próprio. Um ritual impressionante e característico fazia do impetrante o soldado da divindade. A cerimónia terminava pela entrega duma coroa – a distinção honorífica mais apreciada dos legionários -, que devia ser recusada. A honra cabia ao deus. O culto de Mitra facultava a estes soldados mal educados um ideal cavalheiresco. O sentido do dever e a disciplina eram exaltados como as virtudes mais perfeitas. O programa religioso do culto de Mitra tinha um pronunciado carácter viril.

Como se comportavam os velhos deuses olímpicos na época imperial? Oficialmente mantinham a sua posição privilegiada; nos veneráveis templos antigos conservavam-se como os guardas da tradição. Mas já não preenchiam essa função na vida religiosa do povo, enquanto as classes dirigentes há muito procuravam o seu suporte espiritual nos sistemas filosóficos, como sejam as doutrinas dos cépticos, dos epicuristas e dos estóicos.
Baco – o Dionísio dos Gregos – era uma excepção, não como deus do vinho, mas como representante de todos os aspectos vivos e férteis da natureza. O culto de Baco conciliava-se perfeitamente com as novas religiões orientais. Tinha o princípio da expressão pessoal dos sentimentos místicos; pela êxtase, o iniciado podia aproximar-se da divindade.

O que caracterizava então as religiões populares da época imperial, contra as quais o cristianismo tinha de lutar? O que é que lhes permitia impor-se aos espíritos? O que é que as diferençava do culto prestado aos deuses do Olimpo?
Em primeiro lugar eram religiões de mistério. Numa religião de mistério os fiéis formam uma comunidade fechada e os novos adeptos penetram nela após iniciação segundo um cerimonial particular. A iniciação comporta várias fases e atinge o seu ponto culminante no contacto pessoal com a divindade. O homem procura nestas religiões de mistério o meio de se elevar acima do terrestre, de ultrapassar a morte, de se garantir a vida eterna. Um culto é sempre enobrecido pelo desejo de eternidade, mesmo num culto de natureza tão grosseira como o prestado a Cibele. Na antiga religião, o reino de Hades não podia atrair ninguém. Mas a própria morte não punha termo ao alegre cortejo de Dionísio; a alma humana que, durante a sua vida terrestre, se tinha consagrado a Dionísio podia esperar uma participação no poder divino e, assim, vencer a morte.
Existiam outras religiões de mistério, outras vias que conduziam à vida eterna. Havia muitas pessoas que confiam em Hermes, o guia das almas. Os velhos mistérios gregos de Elêusis que se ligavam às deusas do trigo Deméter e Cora (Perséfona) atraíram grandes multidões durante toda a antiguidade. Sila, Cícero e os melhores imperadores romanos contavam-se entre os seus iniciados. Outros, ainda, faziam de Orfeu o seu profeta. Os restos dos sarcófagos dos séculos II e III que chegaram até nós, mostram-nos o desejo de imortalidade representado por mil símbolos. O norte-africano Apuleio, romancista dos últimos tempos da Antiguidade e fervoroso adorador de Ísis deixou-nos um esplêndido exemplo de lenda baseada no desejo de imortalidade surgido nessa época, na história de Amor e Psiqué. Amor, o deus do amor, ama Psiqué, uma princesa mortal. Os dois amantes estão separados e Psiqué tem de empreender uma viagem longa e perigosa, mas o amor fá-la triunfar de todas as privações até poder reunir-se ao seu apaixonado em núpcias celestes. Psiqué significa «calma»; em centenas de sarcófagos encontramos a pequena Psiqué a voar ao encontro de Amor, simbolizando assim o amor, um sentimento que para os romanos, vencia todos os perigos, mesmo amorte, e fazia a alma humana participar na vida eterna.
(Carl Grimberg)

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