A Fome fez descobrir ao Homem o
interesse pela comida.
Saciedade é um prazer visceral
que se foi progressivamente transformando em prazer intelectual.
A guloseima é uma mutação e uma
aberração mental do deleite de comer, que nada tem a ver com a satisfação das
necessidades nutritivas destinadas a manter a vida.
À volta dos alimentos foram
construídas civilizações, por causa deles desencadearam-se e continuam a
eclodir guerras, destruíram-se impérios, foram e são elaboradas leis, trocados
conhecimentos, gerado bem-estar e criadas doenças.
Quer nas situações de
superabundância, quer nas de carência alimentar, são geradas doenças que
necessitam de tratamento por meio de manipulações alimentares. Surgiu assim o
conceito de NUTRIÇÃO CLÍNICA, que é a ciência que estuda a relação dos
alimentos com as doenças.
1. Energia
Humana. Necessidades e Gastos
Ainda que obedecendo a amplas
variações individuais, as necessidades energéticas do ser humano podem ser
determinadas pela medição da quantidade de energia dispendida em 24 horas.
Esta corresponde à quantidade de
energia gasta com o metabolismo basai, com a absorção, e metabolização dos
alimentos e ainda com a atividade física desenvolvida.
Não esquecer que todos estes
fenómenos variam com a composição corporal, principalmente a quantidade de
massa magra, bem como a idade, sexo e raça. Os fatores genéticos que começam
agora a ser estudados parecem desempenhar também um papel importante no
Metabolismo Energético.
Podemos concluir que não é
possível determinar, com segurança e precisão, quais as necessidades
energéticas do ser humano para a manutenção do seu equilíbrio corporal e em
consequência de uma boa saúde porque estas variam de indivíduo para indivíduo e
no mesmo indivíduo de acordo com a idade e a atividade física.
2. Alimentação
Saudável
Em termos científicos e tendo
apenas em conta a composição em nutrientes da alimentação, podemos definir que
um indivíduo se alimenta de forma saudável nas seguintes condições:
I – Ingestão de 30 – 33 Kcal por
Kg de peso corporal e por dia (ração calórica)
II – Cerca de 55% da ração
calórica deverá ser feita a partir de hidratos de carbono de absorção média
(amidos) e lenta (fibras alimentares ou complantix).
III – 1 g por Kg de peso e por
dia de proteínas de alto valor biológico (origem animal), dando preferência ao
peixe o que equivale a cerca de 15% das Kcal diárias.
IV – Quanto às gorduras,
estas não deverão ultrapassar os 30% da ração calórica com a seguinte
distribuição:
7,5% gordura polinsaturada (óleos
vegetais)
7,5% - gordura saturada (gordura
animal)
15% - gordura monoinsaturada
(azeite).
Quanto aos métodos de confeção
mais saudáveis, recomendamos os cozidos e estufados bem como os grelhados, desde
que seja evitada a carbonização superficial
Como gordura de adição usar
sempre o azeite.
Muito importante é também o
número de refeições diárias que nunca deverá ser inferior a 5.
3. Composição
Corporal e sua Avaliação na Prática Clínica
A avaliação da composição
corporal pode contribuir de forma muito importante para conhecer o estado
nutricional e a saúde do indivíduo.
As suas modificações podem
representar um aviso precoce de fatores de risco para processos patológicos,
tais como doença cardiovascular e diabetes ou ainda fornecer dados de
prognóstico numa variedade enorme de doenças agudas ou crónicas.
É sabido que o excesso de massa
gorda está associado a doenças crónicas como hipertensão arterial, acidentes
vasculares cerebrais, diabetes e enfarte do miocárdio e que a boa saúde se
correlaciona estreitamente com uma boa relação entre massa magra (tecido
muscular) e massa gorda.
Os métodos de avaliação da
composição corporal ou do estado de nutrição dividem-se, por razões de ordem
prática, em métodos antropométricos, métodos bioquímicos e métodos especiais.
Os métodos antropométricos são
não invasivos, simples e baratos.
Para o seu uso é necessário
conhecer a altura, o peso, a espessura da prega cutânea em algumas zonas do
corpo, assim como o perímetro do braço e da coxa.
Apenas com os valores da altura e
do peso poderemos ter de imediato dois indicadores muito importantes do estado
de nutrição, isto é, o peso ideal também denominado por peso teórico e o índice
de massa corporal:
Peso Ideal
P(Kg)=A-100-(A-150)/2 (M) ou
4(H)+(I-20)/4
em que A -Altura, I – Idade, M – Mulher,
H-Homem
Um valor de 120% do peso ideal
pressupõe a existência de obesidade, enquanto pesos inferiores a 80%
identificam situações de desnutrição.
Índice de Massa corporal
Correlaciona o peso com a altura,
fornecendo uma ideia sobre a forma corporal bem como sobre a existência ou não
de magreza ou obesidade.
A fórmula usada é:
IMC=Peso/(Altura x Altura)
O IMC dá-nos o peso do indivíduo
por metro quadrado de superfície corporal.
Correlacionando o IMC com a
mortalidade, verifica-se que entre 20 e 25 Kg/m2 não há qualquer correlação,
mas aquela vai aumentando progressivamente atá que existe uma correlação
fortemente positiva quando o IMC é superior a 30 Kg/m2.
Portanto os valores normais do
IMC situam-se entre os 20 e os 26 Kg/m2. Abaixo de 18 Kg/m2 considera-se que
existe desnutrição e acima de 27 Kg/m2 que estamos perante uma sobrecarga
ponderal ou obesidade.
Avaliação da massa muscular e da
espessura do tecido adiposo (pregas cutâneas)
A quantificação de algumas áreas
musculares e do tecido adiposo subcutâneo fornece informação valiosa sobre a
quantidade total ou regional de músculo e de gordura.
Amassa muscular constitui, a
nível do organismo, a maior reserva de proteínas, importante no bom desempenho
da atividade física.
Quanto ao tecido adiposo, a
quantidade de gordura que armazena serve em primeiro lugar como energia de
reserva.
Métodos Bioquímicos
Nas situações em que haja
deterioração do estado nutricional, o indivíduo poderá apresentar modificações
de alguns marcadores bioquímicos que poem em causa defeitos metabólicos. De
entre os mais importantes destacam-se: pré-albumina, albumina, índice de
creatinina/altura e transferrina.
Métodos especiais
TAC, Ressonância magnética,
Técnicas isotópicas e a Impedância Bioelétrica.
A Bioimpedância
A medição da Bioimpedância é uma
técnica que, com os novos aparelhos existentes no mercado, é de custo baixo e
tem interesse porque nos informa acerca do volume total de água corporal,
volume de água extra-celular, bem como a quantidade de massa magra.
O princípio do método baseia-se
na proporcionalidade existente entre a resistência à passagem de uma corrente
elétrica pelo corpo e a quantidade de massa magra, isto é água e eletrólitos
constituintes desse corpo.
Isso acontece porque a massa
magra é a componente corporal mais rica em água e eletrólitos, quando comparada
com a massa gorda ou a massa óssea.
Os tecidos e suspensões celulares
do corpo comportam-se no que respeita à condução da corrente elétrica, de forma
diferente de acordo com o tamanho das células, o volume do tecido, a
capacitância das membranas e a condutividade média intra e extracelular.
Sabemos, por exemplo, que o osso
e a gordura resistem mais à passagem da corrente elétrica do que o músculo e o
sangue. O músculo conduz mais facilmente a corrente elétrica, no sentido do
comprimento do que no sentido da largura; as membranas celulares são más
condutoras, mas boas captadoras; a baixas frequências e porque as células
são más condutoras, a corrente elétrica
flui em primeiro lugar pelos espaços extracelulares; a altas frequências a
corrente elétrica atravessa as membranas celulares sem dificuldade pelo que
passa simultaneamente através dos líquidos estra e intracelulares com
facilidade.
Podemos assim concluir que usando
uma baixa frequência (1 – 10 mA) a bioimpedância mede apenas a água
extracelular, mas usando altas frequências (> 10 mA) podemos medir a água,
A obesidade é indiscutivelmente
nos nossos dias um problema grave de saúde pública.
Definir obesidade com segurança e
de forma científica é impossível. É um estado patológico onde existe um aumento
da quantidade de tecido adiposo em relação ao normal. (É a expressão “normal”
que cria dificuldade em definir obesidade).
Até hoje não foi ainda possível
saber com segurança o padrão de normalidade humana no que respeita à quantidade
de massa gorda e massa magra. Só se pode definir obesidade, de forma
imperfeita, dizendo que consiste numa acumulação excessiva de tecido adiposo,
que resulta de um excesso de ingestão energética quando comparado com a quantidade
de energia gasta no seu metabolismo basal e na sua vida de relação.
Tecido adiposo e suas funções
O excesso de ingestão calórica
conduz ao aumento da quantidade de tecido adiposo, principalmente por
hipertrofia das suas células e em casos especiais por hiperplasia das mesmas.
As células gordas - adipócitos – podem funcionar como células dotadas de
funções endócrinas produzindo uma série de fatores que atuam como hormonas, mas
podendo ao mesmo tempo ser influenciadas na sua fisiologia por hormonas
circulantes.
Sabe-se que os adipócitos começam
a formar-se a partir do 2º trimestre de gravidez, no 1º trimestre após o
nascimento e no período pré-puberdade. Não restam dúvidas de que os fatores
nutricionais da mãe nos últimos meses da gravidez e do bebé nos primeiros meses
de vida, interferem intensamente na fisiologia dos adipócitos nesses períodos.
A massa gorda do tronco responde
intensamente à ação da testosterona enquanto a das nádegas e das ancas é mais
sensível aos estrogénios.
Foi demonstrado que a linha
horizontal que separa a gordura carateristicamente masculina da feminina, com
sensibilidades diferentes às respetivas hormonas passa entre as vértebras L4 e
L5. A gordura abdominal profunda, epiploica, mesentérica e a peritoneal é mais desenvolvida
no homem do que na mulher e no indivíduo idoso do que no jovem.
A espessura máxima da gordura
subcutânea no homem encontra-se a meia distância entre o apêndice xifóide e o
umbigo, enquanto na mulher é localizada a meia distância entre o umbigo e o
púbis. A relação entre estas espessuras é superior à unidade no sexo masculino
e muito inferior à unidade no sexo feminino. Estas caraterísticas do tecido
adiposo mantêm-se mesmo nas situações patológicas de obesidade, permitindo
classificar esta doença em dois tipos diferentes.
Obesidade androide, troncolar ou
central – a maior parte do tecido adiposo localiza-se acima da linha do umbigo.
Diz-se que existe este tipo de obesidade sempre a relação cintura/anca seja
superior a 0,9 no homem e superior a 0,8 na mulher. Está intimamente
correlacionada com as doenças cardiovasculares, dislipidemias, diabetes e
hipertensão arterial.
Obesidade ginóide – a massa gorda
está preferencialmente localizada a nível das ancas e dos membros inferiores.
As principais complicações deste tipo de obesidade estão relacionadas com o
excesso de peso sobre as articulações com aparecimento de artroses dos membros
inferiores bem como perturbações circulatórias do território venoso.
Tipos de tecido adiposo
- Tecido adiposo branco – aquele que
existe no homem na sua maior quantidade sendo o responsável pela obesidade em
geral.
- Tecido adiposo castanho – muito
abundante nos animais que hibernam, pois tem uma influência enorme nos
fenómenos de termogénese. No homem podemos encontrar este tipo de tecido
adiposo no recém–nascido mas desaparece quase por completo nos adultos.
A adipócito e as suas funções
O adipócito é uma célula
metabolicamente ativa, segregando numerosas moléculas ou substâncias capazes de
intervirem sobre o metabolismo do tecido adiposo em particular. Nomeadamente
sobre a diferenciação adipocitária e do metabolismo geral.
Sabemos que substâncias
segregadas pelo adipócito vão interferir com a imunidade, com os fenómenos da
trombogénese, com a pressão arterial, esteroidogénese, etc.
A leptina é uma proteína que tem
um papel primordial na regulação do peso corporal mantendo normal a quantidade
de tecido adiposo. Assim e sempre que haja tendência ao aumento do tecido
adiposo, a secreção de peptina desencadeia a sensação de saciedade bem como
aumenta o dispêndio de energia. Nos indivíduos portadores do gene da obesidade,
podem encontrar-se concentrações elevadas de leptina, mas a própria
adiposidade, bem como o concomitante aumento de insulina, levam a que exista
resistência à ação da leptina tornando-a inativa.
Outros fatores de secreção do
adipócito humano: A adipsina, o fator de necrose tumoral, Angiotensinogénio,
Aromatase, etc.
Tratamento da obesidade
Mais importante do que tratar a
obesidade é fazer a sua prevenção.
No doente obeso a sobrevida está
diminuída e pior anda para o obeso, para a família e para a sociedade, é que há
perturbação da qualidade de vida.
Deve-se estimular o doente a ter
uma quantidade e qualidade de tecido adiposo normais.
Conhecida a dificuldade em perder
peso, devemos organizar os objetivos do tratamento em etapas
1) História
clínica do doente
2) Conselhos dietéticos
a) Alimentos a eliminar: açúcar
de absorção rápida (refinado), álcool, carnes e peixes gordos, molhos,
refrigerantes, gelados, sorvetes, gorduras de adição
b) Alimentos a consumir em
pequenas quantidades: pão, massas, arroz, leguminosas secas, frutos secos,
frutos ricos em açúcar (papaia, banana, figo, uva)
c) Alimentos a aconselhar: carne
de aves sem pele, peixes magros, (solha, linguado, pescada, carapau), frutas
frescas com casca, legumes cozidos ou crus, sumo de limão para temperar, água
(+1,5l/24h), tisanas, chá.
d) Técnicas culinárias: apenas
cozidos e grelhados
3) Organização da dieta
a) Inquérito simples sobre a
alimentação dos últimos 2 dias para avaliar a qualidade dos alimentos e a quantidade
de Kcal habitualmente consumidas
b) Fazer uma redução de 15%,
distribuindo as Kcal do seguinte modo:
15% de proteínas (carne, peixe,
ovo)
55% de hidratos de carbono
(hortaliças, saladas e cereais integrais)
25-30% de gorduras
Todos os meses a dieta deve ser
modificada reduzindo progressivamente 15% à quantidade Kcal/24 horas
c) Uma vez atingido o peso
desejável o doente deverá ingerir cerca de 30 Kcal/Kg/dia, de forma a manter o
peso que atingiu com a dieta
Nesta altura poderá ser permitido
um pouco de gordura de adição, de preferência azeite (2 colheres de sopa/dia) e
peixe gordo 2 vezes por semana (150 g).t
Exercício físico
Desde que foi descoberta a
relação estreita entre os genes e a obesidade, é sabido que o obeso desperdiça
menos calor do que o indivíduo de peso normal, mas que ao mesmo tempo economiza
os seus movimentos, isto ´e, habitualmente é um sedentário. Esta sedentarismo
não acontece só nos adultos: as crianças obesas são habitualmente pacatas,
sossegadas, dando preferência às atividades lúdicas do espírito por comparação
com os desportos que exigem atividade física.
O problema grave é que nestas
situações de obesidade, o próprio excesso de massa gorda se opõe à mobilidade
da massa muscular, e quando o doente faz exercício sente uma fome imperiosa à
qual tem dificuldade de resistir. No entanto o exercício físico no obeso é
indispensável, embora a sua duração deva ser progressivamente aumentada, de
acordo com a perda da massa gorda e o restabelecimento da massa magra.
Alimentação enteral
Fome, desnutrição e doença
constituem uma tríade que tem acompanhado o homem desde o princípio dos tempos.
O estado nutricional tem repercussões não só em termos de saúde ou capacidade
de resposta à doença como, inclusivamente, influencia os próprios processos
fisiológicos relacionados com o envelhecimento. A instituição de um correto
suporte nutricional previne ou corrige muitas das consequências deletérias da
malnutrição e deverá constituir uma prioridade na abordagem de qualquer doente.
Quando não é possível atingir tal
objetivo através da ingestão de uma dieta adequada pela via oral normal, a
alimentação enteral constitui o método mais indicado desde que o doente
mantenha o trato intestinal funcionante.
A alimentação enteral constitui a
forma mais adequada de proporcionar um suporte nutricional na impossibilidade
da alimentação oral normal. É habitualmente bem tolerada, tem menos
complicações e é indispensável para a manutenção da estrutura e função do
intestino, evitando a translocação bacteriana reduzindo a incidência de
infeções e estimulando o sistema imune.
Alimentação e Diabetes Mellitus
A diabetes Mellitus (DM) é um
grande problema de saúde pública. A incidência e prevalência desta doença são
cada vez maiores em todo o mundo e o aparecimento de complicações é causa de
morbilidade em indivíduos muitas vezes ainda jovens.
Em populações que alteraram os
seus hábitos tradicionais para um estilo de vida moderno encontram-se
prevalências muito altas de DM tipo 2.
Assim é de prever que vários
fatores ambientais, entre eles a alimentação, interfiram quer na etiopatogenia da
DM tipo 2, quer, posteriormente, no controlo metabólico da doença e, portanto,
na prevenção do aparecimento das complicações. É necessário encontrar uma
estratégia nutricional comum não só para o tratamento da DM e suas complicações,
mas, se possível, para atrasar o seu aparecimento.
Basicamente, esta estratégia nos
diabéticos é a mesma que para o indivíduo saudável que deseja manter-se com
saúde e prevenir os fatores de risco cardiovasculares – a alimentação saudável
No fundo não se trata de fazer dieta,
mas sim de modificar o comportamento alimentar no sentido de uma alimentação
equilibrada e variada.
Apesar de muitos estudos, investigações
e opiniões no que se refere à alimentação na DM, algumas dúvidas subsistem:
- Será que uma dieta rica em
monoinsaturados conduz, a longo prazo, à obesidade?
- A dieta hipolipídica reduz o
peso?
- O regime com mais HC aumenta o
risco cardiovascular?
-A restrição proteica, na
nefropatia, leva a alterações graves da composição corporal?
- Alguns tipos de aminoácidos
predispõem e agravam a DM?
A frutose e a sacarose têm
efeitos adversos no metabolismo lipídico?
- Os antioxidantes são fatores de
prevenção da doença e das suas complicações? E os ácidos gordos ómega-3?
- Que grau de emagrecimento se
deve aconselhar ao diabético obeso?
- A ingestão elevada de frutose,
ou de ácidos gordos ómega-6 tem efeitos nefastos? Ou são dose dependentes?
No entanto, existem já muitas
informações que permitem melhorar com certeza a capacidade de controlar o
metabolismo glucídico na DM, embora seja por vezes difícil a aplicação das
recomendações nutricionais. As razões são múltiplas e entre elas contam-se a
falta de motivação dos doentes e a falta de tempo e disponibilidade dos
profissionais de saúde para explicar as recomendações dietéticas e para
corrigir os erros ou ajustar o regime alimentar, numa fase posterior. Só a
compreensão dos conceitos nutricionais permitirá ao doente e à população em
geral, a correção dos erros.
Alimentação do Desportista
Uma correta alimentação do
desportista é aquela que, proporcionando um bom estado de saúde ao atleta, se
vai traduzir, quer numa melhoria da sua saúde, quer numa melhoria do seu
rendimento desportivo, quer numa melhoria da sua saúde a longo prazo.
Mas, se é verdade que a
alimentação pode influenciar, positiva ou negativamente, o rendimento desportivo,
não devemos esquecer que este não é o único fator que vai determinar a “forma”
e os bons resultados dos atletas, sendo apenas uma das peças do puzzle que,
conjuntamente com outras, como o treino físico, o estado psicológico, as
aptidões pessoais, etc., vai contribuir para o sucesso desportivo.
Não há propriamente uma dieta do
desportista, ou mesmo uma dieta de determinado desporto, mas sim uma dieta do
atleta, que deverá ser, sempre que possível, individualizada e adaptada a cada
situação.
Os princípios básicos para uma
correta alimentação do desportista assentam, por um lado, na satisfação das
necessidades energéticas e plásticas, através de um adequado fornecimento de
calorias, hidratos de carbono, lípidos, proteínas, água, minerais e vitaminas,
e, por outro, num correto enquadramento destes alimentos em dieta de treino,
dieta de competição e dieta de recuperação.
Calorias
A quantidade total de calorias a
fornecer ao atleta deverá ser calculada em função das necessidades energéticas.
Embora possa haver grandes
variações na ração calórica total, em função da quantidade e intensidade do
exercício físico praticado, aceita-se que a maioria dos atletas deva consumir
entre 3000 a 4000 Kcal/dia, com a seguinte proporção dos seus constituintes:
Glícidos 60 a 65%
Lípidos 25 a 30%
Proteínas 10 a 15%
Glícidos
Os glícidos têm uma função predominantemente
energética. No entanto, têm também uma importante função plástica.
A sua grande importância no
exercício físico resulta do fato de o glicogénio e a glicose serem os
combustíveis que permitem maior rendimento à célula muscular.
Os glícidos complexos como os do
pão, arroz, massa, batatas, frutos e legumes, são os melhores para o atleta
pois, sendo absorvidos lentamente pelo intestino, vão, também lentamente,
preencher as reservas hepáticas e musculares de glicogénio.
Os glícidos simples como o açúcar
têm menos valor para o atleta, pois sendo absorvidos rapidamente fazem com que
os músculos e o fígado não tenham capacidade de absorver toda a glicose posta
rapidamente em circulação, sendo, parte desta, transformada e armazenada como
gordura corporal.
Como se sabe que os glícidos de absorção
rápida são absorvidos mais lentamente quando ingeridos conjuntamente com os de
absorção lenta, este tipo de alimentos deve ser ingerido com a refeição e nunca
isoladamente. De qualquer modo, na alimentação do atleta, os glícidos de
absorção lenta deverão representar pelo menos 80% da soma de todos os glícidos
e os de absorção rápida menos de 20%.
Lípidos
São importantes pelo fornecimento
de energia, ácidos gordos essenciais, nomeadamente o linoleico, o linolénico e
o araquidónico, e como fatores de absorção das vitaminas lipossolúveis.
No entanto, a sua grande
importância a nível de exercício físico, reside no fato de também os lípidos,
nomeadamente os ácidos gordos livres e os triglicerídeos intracelulares, serem
importantes combustíveis da célula muscular durante o esforço, particularmente
nos desportos de fundo. Deve-se, contudo, salientar que os lípidos não são o combustível
ideal da célula muscular durante o esforço, já que o rendimento desta é muito
mais baixo do que com a glicose e, por outro lado, só podem ser utilizados em
aerobiose.
O seu aproveitamento pela célula
muscular durante o esforço aumenta com a melhoria da preparação física do
atleta, o que se torna particularmente importante nos desportos de longa
duração.
O consumo de lípidos é,
geralmente, excessivo nas sociedades desenvolvidas, particularmente o consumo
de gordura saturada, que, como é sabido, está associada ao aumento da
prevalência das doenças cardiovasculares.
O atleta deverá, por isso, não só
consumir lípidos em quantidades moderadas (menos de 30% da ração calórica total),
como equilibrar a ingestão dos vários tipos de gordura.
Proteínas
Têm uma função essencialmente
plástica, sendo ainda importantes pela sua participação nos sistemas enzimático,
imunológico e hormonal. Secundariamente também fornecem energia.
Havendo no desportista um maior
desgaste celular em função do esforço, haverá também, naturalmente, uma
necessidade aumentada no seu consumo.
Sendo assim propõe-se, para os
atletas, um consumo diário a 1,5 g/Kg/dia, o que corresponde a 10 a 15% da
ração calórica total, propondo-se uma relação proteínas animais / proteínas
vegetais >ou = a 1 já que os alimentos de origem animal (carne, peixe, ovo,
leite e derivados) são os que protegem proteína de melhor qualidade (proteínas
de alto valor biológico, tão necessária para a reparação plástica de um
organismo sujeito a grandes esforços.
No entanto, deve ser realçado que
as proteínas de origem vegetal também são importantes para o atleta, não só
porque o consumo excessivo de proteínas de origem animal conduz a uma maior
ingestão de gordura saturada e colesterol, com os consequentes malefícios para
o aparelho cardiovascular, mas também porque as principais fontes destas
proteínas são muito ricas em glícidos de
absorção lenta que são fundamentais para o rendimento da célula muscular
Água
A água é importante para o Homem,
mas no desportista assume uma importância fundamental, pois o défice de água
corporal leva a uma diminuição do rendimento do atleta. Uma perda hídrica de 2%,
correspondente a cerca de 1,5 l, reduz a capacidade de trabalho em 20%, uma perda
de 4% (3 l) leva a uma redução de 40% e uma perda de 10% (7,5 l) pode levar ao
colapso circulatório e à morte.
Por outro lado, há maior
incidência de patologia muscular (contraturas, roturas e distensões) e
patologia tendinosa (tendinites, e roturas tendinosas) nos atletas
desidratados.
Atualmente propõe-se, como
consumo diário mínimo, 1 ml por Kcal/dia, o que para uma ração calórica de 3000
a 4000 Kcal, representa cerca de 3 a 4 litros de água por dia. Essa água deverá
ser fornecida, cerca de 1,5 a 2 l através dos alimentos e o restante como
bebida.
O leite deverá fazer parte da
alimentação diária do atleta, na proporção de 500 a 1000 ml por dia, devendo
ser preferido o leite magro para evitar a ingestão excessiva de gordura
saturada. Em relação ás bebidas alcoólicas, o ideal será que o atleta não as
consuma, no entanto, considera-se tolerável um consumo diário até 250 ml de
vinho de mesa ou 500 ml de cerveja, tomados com a refeição.
As bebidas devem estar à
temperatura natural e às principais refeições não devem ser tomadas em grande
quantidade para que os sucos digestivos não sejam diluídos e perturbada a
digestão dos alimentos.
Minerais
As necessidades globais de
minerais estão aumentadas no desportista em relação ao homem sedentário.
Este aumento verifica-se porque
há uma excreção urinária aumentada para alguns minerais, como o potássio e o
magnésio e porque há uma maior perda pelo suor para outros como op sódio.
Uma alimentação equilibrada
fornece a quantidade suficiente de minerais, não sendo necessários suplementos.
Vitaminas
Quanto às vitaminas também as
necessidades do desportista são maiores. As mais importantes no desportista são
as vitaminas C, B1, B6 e B12, também chamadas “vitaminas do desportista”.
Quando a alimentação é correta,
os suplementos vitamínicos não só não são necessários como podem ser
prejudiciais pois o excesso de algumas vitaminas pode levar ao défice de
outras.
Última refeição antes da
competição
É de um modo geral igual para
todos os tipos de desporto e deverá ser tomada entre 3 a 4 horas antes da
competição.
Não menos de 3 horas, para que a
digestão já se tenha feito e não mais de 4 horas para que os nutrientes possam
ser utilizados durante a mesma.
É uma refeição que deverá ser
quantitativa e qualitativamente normal embora de fácil digestão e, dentro do
possível, dentro dos hábitos do atleta.
Estratégias nutricionais no fortalecimento
muscular
A nutrição tem um papel chave no
fortalecimento muscular. No entanto, devem ser cumpridas as seguintes
condições: estimulação da síntese proteica através do exercício físico,
ingestão adequada de proteínas (aminoácidos), ingestão de substrato energético necessário
à síntese proteica e existência de meio hormonal favorável.
A estimulação da síntese proteica
é feita através de exercício físico específico, visando quer o aumento de
volume e força muscular, quer o aumento da sua potência.
A reconstrução muscular inicia-se
na parte final do treino. É nesse período que devem chegar ao músculo os
aminoácidos provenientes da alimentação, para que assim ocorra a sua
incorporação no músculo.
A ingestão de proteínas para
satisfazer estas necessidades deverá, pois, ser aumentada entre 1,5 a 2 g/Kg/
dia.
Há muitos atletas que na ânsia de
aumentar as suas massas musculares, chegam a ingerir quantidades superiores ao
limite proposto, o que não tem qualquer interesse, pois a consequente produção
de amónia em excesso vai inibir a síntese proteica e assim produzir um efeito
oposto ao desejado.
Por outro lado, o consumo de proteínas
pode comportar outros riscos para a saúde presente e futura do atleta como
aumento do risco cardiovascular, gota, litíase úrica e tendinites causadas pelo
aumento da produção do ácido úrico, diminuição da densidade óssea provocada
pelo aumento da eliminação urinária de cálcio, sobrecarga hepática e renal.
Em relação aos suplementos
proteicos, eles são importantes para complementar o regime na fase de maior síntese
proteica (período seguinte ao treino). Muitos dos suplementos existentes no
mercado são de baixa qualidade, contendo até, alguns deles, substâncias
dopantes. Aconselha-se a sua administração no fim do treino.
Para que haja formação de novo
músculo é necessário que também exista o substrato energético necessário à
assimilação da síntese proteica e de aminoácidos. Os glícidos são a melhor
fonte energética, destacando-se, entre estes, a frutose, que, dadas as suas
caraterísticas, é o substrato energético ideal para a promoção da síntese
proteica muscular: apresenta um baixo índice glicémico não originando,
consequentemente, hiperglicemia e híperinsulinémia, e em baixas doses é
metabolizada diretamente pelo músculo.
É, pois, importante que o atleta,
para além de fazer uma alimentação rica em glícidos complexos, ingira durante e
após o treino, quantidades fracionadas de uma solução de frutose. A 4 – 6%.
Outro aspeto importante para a
síntese proteica muscular é a existência de um ambiente hormonal favorável,
sendo a hormona do crescimento, a somatomedina C e a insulina, as hormonas mais
implicadas neste processo.
A hormona do crescimento, que
promove a síntese proteica, começa a aumentar 90 minutos após uma refeição rica
em proteínas, mantendo-se elevada durante cerca de 4 horas. A somatomedina C,
que influencia a proliferação e diferenciação dos mioblastos, é estimulada pelo
exercício físico de força.
É a ação conjunta destas duas
hormonas que leva à multiplicação, diferenciação e aumento das unidades
contráteis musculares.
A insulina, embora sendo uma
hormona anabolizante por excelência, não deverá ser estimulada, pois, o aumento
dos seus níveis produz efeito anabolizante em todos os tecidos, e não só no
músculo, retirando assim eficácia à síntese muscular e, por outro lado, a
elevação dos seus níveis pode conduzir a hipoglicémia. A utilização de frutose
evita este inconveniente.
Na prática pode fazer-se a
seguinte proposta, com vista ao fortalecimento muscular:
- Três a quatro refeições diárias
com quantidades adequadas de proteínas de alto valor biológico (carne, peixe,
ovos, leite e derivados) e de glícidos complexos (arroz, massa, pão, leguminosas
secas, flocos de aveia, fruta)
- Durante o treino ingerir pequenas
quantidades de uma solução de frutose a 4 – 6%.
- Após o treino ingerir um
suplemento proteico rico em aminoácidos de cadeia ramificada e beber 100 – 150 ml
de solução de frutose a 4 -6%, de quinze em quinze minutos, até à próxima refeição.
Para terminar uma referência às
drogas anabolizantes, nomeadamente à hormona do crescimento e os anabolizantes esteroides,
que, infelizmente, tantas vezes são utilizados pelos ayletas para fortalecerem
as suas massas musculares. De fato estimulam a síntese proteica e aumentam as
massas musculares, quando associadas a dieta hiperproteica e exercício físico
apropriado. No entanto os benefícios não justificam de modo algum os malefícios,
entre os quais se podem citar: atrofia testicular, impotência sexual,
alterações da reprodução, efeitos virilizantes e feminizantes, tumores
hepáticos, cancro da próstata, doenças cardiovasculares, Diabetes Mellitus,
acromegália, lesões tendinosas e musculares, transtornos psíquicos, etc.
O atleta, acima de tudo, é um ser
humano que pode e deve ser saudável, não só enquanto é campeão, mas também no
futuro quando regressar ao palco dos anónimos.
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