HISTÓRIA DE ROMA: O CRISTIANISMO
«Eles devem o seu nome a um certo
Cristo que foi condenado à morte por Pôncio Pilatos, no reinado de Tibério.» já
nesta primeira referência ao cristianismo, devido a Tácito, se percebe a razão
por que a doutrina cristã era mais forte do que os sistemas religiosos
concorrentes.
Havia outras religiões com a sua
origem num acontecimento de origem divina ocorrido na noite dos tempos. Mas
Cristo era «o Filho do Homem»; o milagre da sua ressurreição deu-se durante o
reinado de Tibério, no proconsulado de Pôncio Pilatos. A grande promessa de uma
beatitude eterna para aqueles que seguissem Cristo causou nos espíritos muma impressão
irresistível. Além disso, havia outra coisa que deve ter exercido uma
influência muito mais profunda do que hoje podemos imaginar: Jesus podia
regressar à Terra a todo o momento «para nela julgar os vivos e os mortos». A
força visionária do Apocalipse de S. João e a inabalável convicção dos
evangelistas elevaram a fé dos primeiros cristãos a um ponto tal que lhes
permitia ultrapassar todos os perigos terrestres. O Mestre estava sempre perto
do crente, e não só no exercício do culto, como no seio da comunidade. O
cristianismo oferecia o «poder do Espírito Santo» e a proximidade de Deus; as
outras religiões de mistério apenas facultavam uma experiência religiosa
efémera, só possível, de tempos a tempos, por intermédio de «operações
sacramentais».
Santo Agostinho chamou a atenção
para o facto de a religião cristã nunca ter deixado de existir desde a origem
do género humano.
Cristo proclamara por várias vezes
a sua fidelidade à lei dos Hebreus. O primeiro mandamento de Jesus é também o
de Israel: «Amarás pois o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a
tua alma, e de todo o teu poder». É o maior e o primeiro mandamento. A lei do
amor ao próximo fora formulada no tempo de Moisés; Cristo deu-lhe simplesmente
um aspecto mais positivo: «Tudo o que quereis que os homens vos façam, fazei-o
também vós próprios… O meu mandamento é que vos ameis uns aos outros como eu
vos amei a vós.»
O que Jesus censurara aos
fariseus e provocara o ódio destes era o seu excessivo apego à letra da lei e a
sua falta de profundidade espiritual. Deus de quem tinham feito uma entidade
longínqua e vingadora, foi apresentado por Jesus como o Pai infinitamente bom e
preocupado com o mais ínfimo de todos os seus.
Os apóstolos escolhidos por
Cristo tinham começado imediatamente as suas pregações.
O sinédrio judaico, que
pretendera e conseguira que Jesus Cristo fosse condenado, tentou opor-se à
difusão da sua religião e organizou perseguições. O diácono Estêvão foi selvaticamente
lapidado pelos Judeus poucos meses após o Cálvário. Foi o primeiro mártir.
Entre os perseguidores dos
primeiros cristãos distinguia-se um judeu chamado Saul pelos seus irmãos de
raça e Paulo pelos greco-romanos. Um dia quando se dirigia a Damasco
converteu-se milagrosamente e desde essa altura tornou-se um dos mais ardentes
propagandistas da fé cristã. Fundou em Corinto uma comunidade que depressa
haveria de ter em Roma uma comunidade-filha. Quando veio a Roma, veio como
prisioneiro, enviado pelas autoridades romanas em Jerusalém, a fim de ser
julgado pelo imperador, após nosw judeus ortodoxos terem ameaçado lapidá-lo por
haver introduzido pagãos no templo. Segundo
a tradição Paulo morreu mártir, tendo sido decapitado. S. João, o autor do
quarto Evangelho, do Apocalipse e de três epístolas, evangelizou sobretudo na
Ásia Menor. Foi preso e supliciado no reinado de Domiciano, mas morreu de morte
natural em Éfeso, já de avançada idade. Além de se referirem aos apóstolos, os
escritos do Novo Testamento mencionam o nome de dezenas de eclesiásticos e de
laicos que, sob a direcção de bispos instalados nas grandes cidades, difundiram
a doutrina de Cristo.
O Império Romano oferecia um terreno
quase preparado para a expansão do cristianismo. A pax romana permitia a livre
circulação por todos os lugares e por toda a parte os homens esperavam da religião
alguma coisa mais que as cerimónias de um culto oficial em que nem mesmo
acreditavam aqueles por quem era celebrado. As religiões orientais, centradas
no Além, tinham conhecido uma grande voga em Roma e no império.
O cristianismo correspondia às
aspirações da alma humana, à sua inquietude perante a morte, ao seu desgosto em
face das torpezas morais do paganismo. Como proclamava a igualdade dos homens
perante Deus, encontrou os seus primeiros adeptos entre aqueles a quem a
sociedade humilhava – os pobres - e aqueles a quem ela considerava como animais
– os escravos. Estes últimos tomaram, acaso pela primeira vez, no exercício do
culto e na vida comunitária, consciência da sua dignidade humana. A base da
doutrina é a mensagem de Cristo dirigida a todos os homens, ricos ou pobres,
escravos ou livres. A salvação é oferecida a todos.
Foi por isto que os primeiros
cristãos recusaram com uma firmeza quase sobre-humana, trair o seu Senhor, e
Salvador. Os oprimidos impressionaram-se. O martírio era o seu triunfo, a
alegria de poderem sofrer com e por Cristo e a perspectiva de uma beatitude
eterna tornaram-nos insensíveis a todas as dores.
Assim a nova religião operou
maravilhas. E o facto causou nos pagãos uma impressão indelével. Segundo a
expressão de Tertuliano “o sangue dos mártires foi a semente da Igreja”. Uma força
interior habitava estes mártires: a que é dada pela Fé e pelo amor ao próximo.
A religião cristã dava esperança e consolação a todos aqueles que se dobravam
sob o peso das dificuldades da sua existência e das suas faltas. Quando se sabe
quanto os oprimidos tinham de sofrer nesse tempo, compreende-se o atractivo de
uma religião que permitia a estes infelizes elevarem-se a uma nova visão do
mundo e lhes dava uma razão de viver e de morrer.
Em contrapartida, durante muito
tempo, os ricos e os poderosos permaneceram cépticos relativamente ao
cristianismo. O preceito «ama o próximo como a ti mesmo» não os atraía.