Mensagem de boas vindas

Bem Vindo ao blog Campo da Forca. Apontamentos pessoais também abertos a quem os quiser ver.

11/12/11

Caracterologia - 3ª (e última) Parte



Caracterologia das propriedades

O método do estudo das propriedades dos caracteres (impulsivo, mentiroso, irritável, etc.) é outro método de estudo dos caracteres.
Notar que «o objeto humano» não se presta bem a inspeções e que os julgamentos podem modificar a natureza das propriedades.
Existem inumeráveis sistemas caracterológicos estabelecidos a partir do método das propriedades. Vamos só considerar os que têm valor em psicotécnica e eventualmente em psicoterapia:

A caracterologia de Malapert
Utiliza os três géneros de Ribot (os sensitivos, os ativos e os apáticos) ou (Fouillé) os sensitivos, os intelectuais e os voluntários.
Malapert começa por estudar quatro propriedades:
Sensibilidade (distinguem-se Apáticos, Sensitivos, Emotivos e Apaixonados),
Inteligência (distinguem-se Analistas, Críticos, Refletidos ponderados  e Especulativos), Atividade (distinguem-se Inativos, Ativos e Reativos) e
Vontade (Abúlicos ou rotineiros, Meio voluntários ou Veleidosos e Grandes voluntários).
Malabert apresenta, depois de definir estes tipos parciais, a maneira como se combinam num todo:
Apáticos, divididos em
            Apáticos puros (Obtusos e Inertes),
            Apáticos inteligentes (Calculadores) e
            Apáticos ativos (Lentos e Calmos),
 Afetivos, divididos em
             Sensitivos (Sensitivos vivos e Sensitivos passivos),
             Emotivos (Emotivos melancólicos e Emotivos impulsivos) e
            Apaixonados,
Intelectuais, divididos em
             Intelectuais afetivos (Diletantes e Apaixonados) e
             Especulativos,
Ativos, divididos em
             Ativos medíocres,
             Agitados e
             Grandes ativos,
Temperados divididos em
              Amorfos (Equilibrados medíocres) e
               Equilibrados superiores e
Voluntários, divididos em
              Senhor de si (Tipo de luta e Ponderados) e
               Homens de ação.

A tipologia de Jaensch
Baseado no fenómeno da imagem eidética (as imagens eidéticas orientam-se frequentemente no sentido das imagens consecutivas – perceção puramente periférica – ou das imagens ideafetivas – imagem de evocação – Assim podem distinguir-se sujeitos que têm imagens eidéticas de tipo central e sujeitos que têm imagens eidéticas de tipo periférico. Estes dois fenómenos corresponderiam a duas propriedades caracterológicas fundamentais:
          «Tipo integrado» e
          «Tipo desintegrado».
A pessoa integrada é uma pessoa que está inteira em cada uma das suas partes. Existe estreita dependência não só entre as diferentes funções psicológicas, mas também entre o mundo pessoal e o mundo exterior.
O desintegrado é uma pessoa relativamente firme e impermeável. A sua personalidade vive uma vida própria, fechada e contínua. Permanece fechado às sugestões exteriores.

A tipologia de Jung
Jung chegou à definição de um
      «Tipo introvertido» e um
      «Tipo extrovertido»,
palavras que entraram no vocabulário não especializado.
O introvertido é, em menor ou maior grau, refratário a influência do mundo exterior. O extrovertido volta-se para o mundo exterior e adere ao meio.
Já Binet tinha distinguido entre
        «Tipo subjetivo» e
         «Tipo objetivo».

O sistema caracterológico de Heymans e Wiersma e a caracterologia de Le Senne

As três propriedades gerais que se distinguem são:
        a Emotividade,
        a Atividade e
        a Repercussão das representações.
Combinando-se formam oito tipos. Cada tipo caracterológico recebe uma fórmula e um nome. Distinguem-se:
  • Emotivos (E) inativos (nA) primários (P)……………EnAP            nervosos
  • Emotivos inativos secundários (S)………………………EnAS          sentimentais
  • Emotivos ativos (A) primários……………………………EAP             coléricos
  • Emotivos ativos secundários………………………………EAS             apaixonados
  • Inemotivos (nE) ativos primários………………………nEAP            sanguíneos
  • Inemotivos ativos secundários…………………………nEAS             fleumáticos
  • Inemotivos inativos primários…………………………nEnAP             amorfos
  • Inemotivos inativos secundários………………………nEnAS            apáticos

Complementos  

Caracterologia reflexológica
A criação duma caracterologia reflexológica baseia-se na observação de que a Excitação e a Inibição se comportam como duas funções opostas, cuja importância relativa é diferente nos diferentes indivíduos da mesma espécie.
Esta tipologia foi, antes de estabelecida para os animais e só depois foi aplicada ao homem.
Estuda os reflexos condicionados, os estímulos condicionais e os fatores que comandam a dinâmica do sistema nervoso central.
Ivanov-Smolensky (Escola de Pavlov) distinguiu os seguintes tipos:
      Tipo equilibrado,
      Tipo excitável,
      Tipo inibido e
      Tipo inerte.

O estudo da inteligência
O estudo da inteligência, considerada como aptidão operacional, não pode ser negligenciado do ponto de vista estritamente caracterológico.
Paulhan classifica os espíritos em
      «espíritos lógicos»,
       «espíritos falsos»,
       «espíritos ilógicos» e
       «espíritos pueris».

Mentré distingue o estudo dos caracteres  e o estudo das maneiras de pensar, que seria a noologia.

Spanger, no seu sistema, distingue seis tipos (homem estético, homem económico, homem teórico, homem religioso, homem político e homem social. Cada grupo comporta variedades superiores e variedades inferiores. Observam-se por outro lado, certo número de combinações particularmente frequentes (económico-político, social-religioso, teórico-estético); e oposições  (a social-religioso com teórico ou económico,  ou de político com estético-religioso).

A caracterologia sociológica
Qualquer caracterologia social é uma caracterologia das propriedades e, por outro lado, qualquer caracterologia das propriedades tem um fundo social.
O estudo dos tipos criminais efetuado por Lombroso é um exemplo de caracterologia sociológica. Uma caracterologia do criminoso introduz de facto o estudo da caracterologia do normal. Os germes do crime encontram-se em qualquer conduta humana.
Mikhailowski de maneira mais puramente sociológica distinguiu o «Tipo adaptado (prático)» e o «Tipo inadaptado (ideal)» e para ele o tipo adaptado é um tipo inferior que se torna nas sociedades modernas “o apêndice insignificante de um todo inumano”, enquanto o tipo inadaptado participa muitas vezes no caminho do progresso social.
Dentro do âmbito da caracterologia numa perspetiva sociológica concreta é possível realizar estudos das diferentes classes sociais e dos diferentes grupos profissionais, utilizando os três planos metodológicos,  com o método das correlações se um determinado carácter corresponde a uma profissão definida, depois procurar saber se essa profissão não pode aparecer como uma função social que toma o aspeto de uma propriedade específica e por fim estudar a possibilidade de uma causalidade psicossocial, por exemplo, se o fato de pertencer a uma determinada classe social determina ou não certos aspetos do caráter.

Szondi estabeleceu correspondências entre os tipos caracterológicos derivados da psicologia patológica e grupos de profissões:
  • Homossexual (ternura, servir outrem, submissão, feminilidade passiva; o tocar é a caraterística dominante): cabeleireiro, maquilhador, dermatólogo, ginecólogo; empregado de estabelecimentos balneares, negócios com roupa branca, costureiro de moda, artista, cantor, dançarino; empregado de café, hoteleiro, pasteleiro, cozinheiro.
  • Sádico (agressividade, necessidade de poder, virilidade ativa, a caraterística dominante é a sensibilidade cinestésica e muscular): cocheiro, empregado de quinta, domesticador de animais, veterinário, matador de animais, enfermeiro de operações, cirurgião, dentista, anatomista; carrasco; homem do talho, partidor de pedra, mineiro, sapateiro, escultor; motorista, soldado; lutador, professor de ginástica, massagista.
  • Epilético (acumulação de afetos brutais e descarga em momentos inesperados; sentido do equilíbrio, servir): entregador de mercadorias, cocheiro, marinheiro, aviador; ferrador, motorista, bombeiro, pirotécnico, padeiro, limpa-chaminés; padre, monge, freira, assistente social.
  • Histérico (acumulação de sentimentos finos e descarga desses sentimentos em momentos inesperados; exibicionismo afetivo): apregoadores de feira ou das ruas; artistas, comediantes; políticos
  • Esquizofrénico Catatónico (fechar-se em si, admiração de si próprio, narcisismo, egocentrismo, autismo; eliminação dos órgãos sensoriais): soldado; professor – matemática, física, filosofia ; contabilista, telegrafista; desenhador de cartas geográficas, gravador; guarda-noturno, guarda de farol; manequim.
  • Esquizofrénico Paranóico (dilatação do ego, dar importância a si próprio, inflação psíquica, criação; do ponto de vista sensorial: sentir, ouvir): construtor, organizador; arqueólogo, mitólogo, astrólogo, grafólogo, psiquiatra, psicólogo; músico; farmacêutico, droguista, químico; juíz, detetive, advogado, contra-espionagem.
  • Ciclofrénico Depressivo (busca de objetos e de valores, apego aos objetos acumulados; sentir): logista, filatelista, antiquário, agente de leilões, empregado de museu; limpeza química, pintor, serviços de higiene, desinfeção; varredor de ruas, vendedor de trapos, tripeiro, trabalhador do couro; crítico.
  • Ciclofrénico Maníaco: (gosto pelos objetos, assegurar a posse, ou agarrar-se a objetos, ou ainda rejeitar os objetos; o gosto é dominante): empregado de café ou restaurante, cozinheiro, provador de vinhos; instrumentista de sopro; vendedor e comprador; linguista e professor de línguas; estomatólogo.
Sistema caracterológico de Klages
Procura uma estrutura e dimensão da realidade humana. Distingue entre matéria ou massa do caráter (talentos, aptidões e faculdades), a natureza ou qualidade da personalidade (propriedades, instintos, tendências e móbiles) e a sua estrutura (arquitetura do caráter). Esta disposição seria proveniente de uma força vital inconsciente. Opõe os dois planos da vitalidade (corpo e alma) aos seus dois inimigos (espírito e vontade).

O diagnóstico caracterológico:
Os diferentes métodos de diagnóstico caracterológico rápido são os seguintes:
·         Os questionários e interrogatórios;
·         O estudo dos comportamentos;
·         Os testes projetivos,
·         Os testes do método dos campos significativos;
·         A grafologia e
·         A morfologia somática.

Hereditariedade dos caracteres psicológicos
Galton estudou gémeos monozigóticos. As suas experiências mostraram que a hereditariedade era duas vezes mais ativa do que o meio na determinação do caráter.
Estes trabalhos foram criticados com muita frequência. No domínio da criminologia alguns autores acentuaram, pelo contrário, o papel do meio.
Parece difícil negar a existência de uma caracterologia ligada a determinantes constitucionais. No entanto o grau no qual essa hereditariedade é determinante está muito longe de ser estabelecido e parece provável ser sensivelmente menor do que aquilo que alguns autores pretenderam. Ainda por cima, seria necessário tomar em consideração a ação de uma verdadeira hereditariedade psicológica. Para Freud, o nosso superego constitui-se à semelhança do superego dos nossos pais.

A Evolução dos Caracteres, no decurso da nossa existência
Para os constitucionalistas, os fatores biológicos que constituem os seus alicerces, encontram-se fixados desde a infância.
No entanto a própria psicanálise acentua o dinamismo e plasticidade da criança. Por outro lado, a possibilidade de curas psicoanalíticas acima dos 40 anos, mostra que o carácter apresenta possibilidades de renovação. Mas é preciso sublinhar que não é excecional que os tipos caracterológicos têm uma grande estabilidade. Por outro lado, a transformação do meio pode levar, embora a pessoa permaneça a mesma no que diz respeito ao seu fundo caracterial, a mudanças completas no que respeita à maneira como essa pessoa se mostra no exterior. Assim, vê-se frequentemente que não é um carácter que se modifica, mas sim a natureza das relações caracterológicas.
Portanto, o procedimento sensato, não será tentar transformar um carácter, o que seria quase completamente impossível, mas sim utilizá-lo da melhor maneira, tal como ele é verdadeiramente.


Conclusão
As diferenças que existem entre os três grandes métodos da caracterologia explicam as divergências entre sistemas caracterológicos que por princípio, parecem nunca ser redutíveis. Não deixa de ser verdade que um dos objetivos da caracterologia é atenuar essas diferenças ao máximo e voltando aos grandes sistemas que apresentámos, ver-se-á que já atualmente é possível encontrar-lhes, em certa medida, algumas similaridades.
A objetividade caracterológica não é neutra. A exploração das estruturas age sobre a organização da realidade humana, modifica-a e constitui-a parcialmente. Esta verificação consegue esclarecer um certo número de problemas fundamentais e pode renovar a maneira de conceber uma dificuldade que se coloca classicamente à caracterologia: a liberdade.
Dado que o homem é um ser que se modifica, no seu ser, pelo conhecimento vivido, os fundamentos duma liberdade ontológica devem ser procurados numa propriedade que definisse as relações do ser do homem com o conhecimento vivido desse ser e, inversamente, desse conhecimento com esse ser.

Sem comentários:

Enviar um comentário