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16/10/13

RESUMO COMPACTO DA SÍNTESE INTERPRETATIVA DA HISTÓRIA DE PORTUGAL -5: Memórias históricas

Portugal foi sempre um único reino sem identidades fortes separadas, mas dentro dessa unidade política, no entanto, desenvolveram-se várias memórias históricas. Por exemplo, da dinastia, das instituições eclesiásticas, das famílias e linhagens aristocráticas e dos municípios, como se vê nas actas de Cortes. Todas estas entidades, instituições e grupos produziram documentos e arquivos, quer administrativos, quer narrativos. Nalguns casos, atingiu-se mesmo um nível literário e técnico muito elevado, como com a "Crónica de El-Rei D. João I" (cerca de 1434) de Fernão Lopes ou as "Décadas da Ásia" (1552-1563) de João de Barros. A História de Portugal recebeu esses vários contributos, como no caso do poema "Os Lusíadas" (1572) de Luís Vaz de Camões, que, aliás, deveu muito aos materiais narrativos acumulados até então: lido a partir do século XIX como a epopeia colectiva de um povo, o texto privilegia de facto os feitos de algumas famílias aparentadas com a do próprio autor. Mas foi a História das dinastias reinantes (e depois a dos governos) que seria finalmente considerada «nacional», na medida em que, a partir do século XIX, veio a ser assimilada ao processo de projecção de uma nação soberana e construção de um Estado moderno. As crónicas dos reinados, promovidas pelos próprios reis, constituíram o ponto de partida desta História. Em 1846, Alexandre Herculano iniciou com grande êxito de audiência a publicação de uma "História de Portugal" que as gerações seguintes tomariam como a primeira referência propriamente «científica» da historiografia portuguesa».
A História constitui, desde então, um terreno privilegiado de reflexão e debate sobre o país, e a ela se dedicaram alguns dos intelectuais de maior destaque da vida pública portuguesa dos séculos XIX e XX: Oliveira Martins ("História de Portugal (1879), Teófilo Braga, António Sardinha, António Sérgio ou Jaime Cortesão. O estudo do passado chegou ainda ao grande público, desde o século XIX, através da ficção à maneira de Walter Scott e Victor Hugo, da qual Almeida Garrett ("Frei Luís de Sousa", "O Arco de Santana", 1845) e Alexandre Herculano ("Eurico, o Presbítero", 1844; "O Monge de Cister", 1848; "Lendas e Narrativas", 1851) deram os melhores exemplos. Mas a História também preencheu o horizonte dos portugueses visualmente, através do tema histórico na pintura (como a de José Malhoa), na estatuária (como a de Francisco Franco, inspirada pelos painéis de São Vicente de Fora) e no cinema (como no filme "Camões", de José Leitão de Barros, em 1946, ou no "Non ou a Vã Glória de Mandar", de Manoel de Oliveira, em 1990), e até na reactivação de estilos, como o neomanuelino no século XIX. A História foi sempre feita por muita gente, com vários objectivos e de várias maneiras.
No entanto, a memória histórica oficial ou publicamente relevante para os portugueses nem sempre incluiu todo o passado do país, não só por limitações da investigação e conhecimento, mas também por óbvia conveniência política e cultural. Na Idade Média, por exemplo, as memórias históricas remeteram geralmente as suas origens, não para quaisquer populações primitivas, mas para as prestigiadas civilizações clássicas do Mediterrâneo, por via da mitologia grega e romana, com a fundação de Lisboa atribuída por exemplo a Ulisses.

A maneira como os portugueses conceberam o seu passado mudou, assim, ao longo da História. Como em todos os países, a memória nacional consistiu num jogo politicamente conveniente de supressões e descobertas. A perseguição da Inquisição durante os séculos XVI-XVIII à minoria «cristã-nova», composta sobretudo pelos descendentes dos judeus convertidos, foi recuperada e valorizada a partir do século XIX, por liberais e republicanos, embora não necessariamente bem compreendida. Por contraste, porém, o facto dos portugueses e seus descendentes radicados na América portuguesa terem sido, entre finais do século XV e meados do século XIX, os maiores traficantes de escravos do planeta foi sempre muito menos claro, tal como o pouco entusiasmo que a abolição da escravatura da escravatura no século XIX suscitou de um lado e outro do Atlântico lusófono.

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